Resumo de sua biografia

Dora Mariana Ribeiro Ferreira da Silva nasceu em Conchas/SP, em 01/07/1918, e faleceu em São Paulo em 06/04/2006, com 87 anos. A poeta recebeu por três vezes o prêmio Jabuti e foi contemplada pela Academia Brasileira de Letras com o Prêmio Machado de Assis pelo livro Poesia Reunida (1999).

sexta-feira, 29 de março de 2013

Ser juntos

Se estou só estou contigo
comigo estás e nunca a sós
assim não padecemos nós
por sermos juntos e ao mesmo tempo.
Espelha o amor longinguamente
a imagem terna e breve
mas nunca é antigamente
nossa hora dourada e leve.
Perdemos os nomes - não bastavam
para o colóquio que somos
incessantemente.
Inventamos outros nomes que também
não bastam - e os esquecemos.
Falas em mim e eu em ti
já não sabemos quem somos
imersos no mesmo sono.
Sutil, sonhas em surdina
ou entro no teu sono, retina
aberta para o que de mim
sonhas. Assim nos encontramos
e nunca nos perdemos.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Tanta tristeza nas águas...


Tanta tristeza nas águas
na face que refletia
o espelho frágil da lua
miragem melancolia.

Em que reino vive agora
a princesa que vivia
na infância sob amoreiras
acesas à luz do dia?

Onde o sol, onde o tumulto
de pombas no céu ardente
onde o frio da tarde morta
entre escombros do poente?

Tanta tristeza nas águas
na face que refletia
o espelho frágil da lua
miragem melancolia.

Onde a lua marinheira
no alto céu que surgia __
negro mar cheio de espantos
mordido de ventanias?

Onde o Rei do reino ausente
onde a fada que fazia
do mundo um sono profundo
e do sonho a luz do dia?

Tanta tristeza nas águas
na face que refletia
o espelho frágil da lua
miragem melancolia.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Noturno I

Estrelas pendem da noite,
videira delirante.
Coroada de espelhos e ametistas
transmutas a carne em nudez

guardiã, sacerdotisa,

nos vales da distância
rumina em silêncio
teu rebanho tranquilo.

Noturno II

Nossos olhos nos pertencem __
não o dia.
Amor não nos pertence
nem a morte.
Apenas pousam na pérola mais fina.
Desce o luar
no flanco de rios precipitados
folhas se alongam
caules estremecem.

A noite já desfere
seu punhal de trevas.

Noturno III

Pétala da noite
pálpebra fixa dos que olham para sempre a morte
nave perdida e sem memória
pérola marinha
arremessada às águas.

Rosa intranquila
pólen do amor sem pouso
mênade errante, os longos cabelos torturados,
tu, sublevada, que me prendeste em teu anel de insônias
e que desfias no espaço
o claro colar das águas:
porque acordas no meu peito a sede dos desertos
e me aprisionas, pássaro, em teu arco de prata?

Ânfora

Das amargas amêndoas dos teus olhos
nascem rios de roxa nostalgia
morrem nas águas nenúfares da lua
em urdidura de estrelas sem destino
ai que teces fiandeira tenebrosa
entre céu e abismo
cumes e declives
à flor das águas
no dorso das fogueiras
nas ráfagas do vento
em terra nua
ai que teces fiandeira sob a lua
sob o linho do sono
sob a areia
sob o mármore de mundos esquecidos.

À janela da noite

A lua em seu círculo.
Piam pássaros de sombra.
Meu coração deita raízes, hera escura
na solidão de um muro.
Cintila a constelação de Andrômeda
em sua haste de lágrimas.
Nos grãos do vento
partiram pombos em tumulto e brancura.
Nem a glória
nem o lamento:
vento e planura.